O SIGILO BANCÁRIO NO DIREITO BRASILEIRO E O POSICIONAMENTO DO STF
A Constituição Federal de 1988 (CF/88) estabelece que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas (artigo 5, inciso X), bem como que é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem
judicial (artigo 5, inciso XII).
Por sua vez, o sigilo bancário representa um pilar essencial do sistema financeiro como um todo, já que visa preservar a confidencialidade das informações dos clientes, protegendo sua privacidade contra acessos indevidos. Revela-se, portanto, como uma garantia fundamental para a segurança jurídica e para a confiança nas instituições financeiras.
Apesar dessa garantia individual à privacidade e à intimidade, sob o ponto tributário, a Lei Federal n. 5.172, de 1966 (Código Tributário Nacional – CTN) determina que as instituições financeiras são obrigadas, mediante intimação escrita, a prestar ao Fisco todas as informações de que disponham com relação aos bens, negócios ou atividades de seus clientes (artigo 197, inciso II), excetuadas as hipóteses de segredo profissional previstas no seu parágrafo único.
Além disso, a Lei Complementar n. 105, de 2001 (LC 105/2001) disciplina com maior detalhamento a obrigação das instituições financeiras no fornecimento de dados e movimentações bancárias de seus clientes, sem que isso seja considerado como uma violação ao sigilo bancário. A esse respeito, o artigo 5, caput, e os parágrafos 1 (incisos I a XV) e 4, da LC 105/2001, dispõem sobre as modalidades de operações financeiras submetidas à obrigatoriedade de informação às autoridades fiscais.
O exposto até aqui revela que, em matéria de fiscalização tributária, “o sigilo bancário não constitui um valor em si. Tem cunho instrumental e não ostenta, de modo algum, caráter absoluto.” (PAULSEN, Leandro. “Curso de Direito Tributário Completo”, Editora Saraiva, 2024, página 388).
As razões para tanto, e que levaram o legislador brasileiro a admitir a quebra do sigilo bancário pelas autoridades fiscais em casos específicos, desde que com a devida proporcionalidade e motivação, decorrem do seu dever de ofício (exercido de acordo com o interesse público) de fiscalizar e apurar indícios efetivos da prática de crimes e fraudes tributárias.
É certo, entretanto, que os dados bancários obtidos devem ser mantidos em sigilo pelas próprias autoridades fiscais, e nunca publicizados sob qualquer modo e pretexto, permitido, entretanto, o compartilhamento dos dados com as autoridades fiscais dos demais entes federados exclusivamente para fins de fiscalização quanto ao cumprimento das obrigações tributárias de suas respectivas competências (artigo 37, inciso XXII, da CF/88).
Caso configurado o abuso na conduta das autoridades fiscais, os dados obtidos podem ser considerados ilegais, resultando na nulidade das provas coletadas.
O entendimento acima foi avalizado em diversas oportunidades pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como, por exemplo, no julgamento do Recurso Extraordinário (RExt) n. 601.314 (Tema 225), do RExt n. 1.055.941 (Tema 990) e da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. 2.859.
Destacamos, ainda, o julgamento do RExt n. 855.649 (Tema 842) que reconheceu a constitucionalidade do artigo 42 da Lei Federal n. 9.430, de 1996, que determina às instituições financeiras, independente de ordem judicial, fornecerem automaticamente à Receita Federal do Brasil (RFB), no caso de pessoa física, dados relativos às movimentações bancárias de valor individual superiores a R$ 1.000,00 (mil reais) e que o seu somatório, dentro do ano-calendário, ultrapasse o valor de R$ 12.000,00 (doze mil reais).
Ante todo o exposto, embora o sigilo bancário seja um direito protegido, ele poderá vir a ser flexibilizado em situações onde haja a necessidade de fiscalização tributária, sempre observando os limites legais e constitucionais para garantir a proteção dos direitos dos cidadãos e a eficiência na arrecadação tributária.
Este artigo tem caráter meramente informativo e não substitui a análise de um caso concreto. A orientação de um advogado especializado é indispensável para esclarecer dúvidas específicas e garantir o cumprimento da legislação aplicável.
Arthur Salibe – Sociedade de Advogados